REGRAS, ACORDOS E COMBINADOS. COMO EDUCAR?

Regras, acordos e combinados.. E quando as crianças e jovens NÃO FAZEM o que esperamos deles. Uma conversa fundamental para quem educa conscientemente.

EDUCAÇÃO HUMANISTA

7/14/20249 min read

Regras, Acordos e Combinados. Como bem educar?

Imagine crianças obedientes, adolescentes disciplinados que cumprem sempre com as regras, acordos e combinados, e que fazem exatamente o que é esperado deles !! Ah, seria um convívio PERFEITO, não é mesmo? Mas despertemos do sonho de Alice do País das Maravilhas, porque a realidade é outra.

Aliás, nós adultos ignoramos muitas regras de convívio. Por exemplo, no trânsito quem já não ultrapassou os limites de velocidade? E quando acordamos ir a um compromisso em certo horário e nos atrasamos, deixando o outro esperar? E quando não cumpro com recomendações médicas? Incontáveis exemplos.

Em nosso caso precisaríamos passar por processos de reeducação em algumas áreas da vida. Mas quando se trata de crianças e jovens, lembremos que eles se encontram em FORMAÇÃO. Logo, é natural que resistam as regras, quer seja na hora de dormir, na escola ao fazer a tarefa. E isso faz com que tenhamos de repetir várias vezes com as mesmas instruções, em que somos levados pelo cansaço, e por vezes, deixamos de lado todo o nosso propósito de educar. E nisso tudo, há também uma grande confusão conceitual sobre o que são as regras, os acordos e os combinados.

Logo, é preciso compreender cada um desses campos, a começar pelas regras.

Regras são aquelas diretrizes fundamentais que PRECISAM existir se quisermos ter um convívio respeitoso. Elas vão nortear aqueles comportamentos que necessitamos para viver em harmonia. São como códigos de ética para a vida em sociedade.

Já os acordos, são as negociações necessárias para que as regras aconteçam. Acordos, como o próprio termo diz, firmam uma PARCERIAS. E precisam ser via de mão dupla e acontecer de forma participativa, quer seja em casa ou na escola.

E os combinados? São aqueles que indicam os resultados. Ou seja, se acordos forjados a partir das regras, foram cumpridos ou não, ou se se perderam no meio do caminho. Então, para melhor entender tudo isso, imaginemos que resolvemos viajar. As regras são a nossa meta. Indicam para onde iremos, e qual será o nosso destino. Nesse caso, as regras nos remetem a um lugar comum: um convívio pleno, feliz. Já os acordos são o planejamento dessa viagem, a previsão dos lugares que iremos, o que levaremos na mala e até o jeito que vamos caminhar, e o meio de transporte: ônibus, avião, bicicleta ou a pé. Resolvida a questão, o que são então os combinados?

Os combinados apontam em direção ao resultado final. É quando avaliamos se chegamos juntos ao nosso destino. Os combinados nos levam a questionar: Fomos na mesma direção? Ou cada um foi para um lado, e tumultuando a viagem dos outros?

Existe um desafio importante a ser superado: as resistências. Sobre esse tema, recomendo fortemente um livro do González Pecotche, criador da Pedagogia Logosófica, intitulado ‘Deficiências e Propensões do Ser Humano'. Nele Pecotche apresenta 44 deficiências psicológicas. A expressão “deficiências psicológicas” pode parecer incomum, mas ela nos leva a refletir sobre comportamentos que vão na direção oposta ao das virtudes. E ele aponta uma delas: a desobediência. Pecotche deixa claro que ao falar do tema, não o qualifica como “obediência cega”. Porém, reflexiva, inteligente. E revela que temos uma forte tendência a desobedecer, mesmo naquelas situações que sejam para nosso bem. Sabemos o que é bom para nossas vidas, mas desobedecemos aqueles princípios que nos levariam para uma boa senda. Então, o que fazer diante desse quadro na hora de educar regras? Primeiramente, temos de criar um plano estratégico para que as regras sejam acolhidas. Para que sejam percebidas por todos como necessárias, na família e na escola.

Então, vamos agora passar ao campo da prática em que partilharei quatro passos, que acredito poderão ajudar na hora de educar.

PASSO UM.

É indicado que pais e professores dialoguem com as crianças e jovens sobre as regras da casa e da escola, de forma simples e objetiva. Parece óbvio, mas não é. Frequentemente cobramos das crianças e dos jovens o de regras. Mas pulamos essa etapa, a de dialogar sobre as mesmas, Logo, eles sequer sabem quais são as regras que precisam cumprir, e vão descobrindo aos “trancos e barrancos” como devem ou não se portar. Sem saber a razão pela qual obedecem a essa ou aquela regra. Tudo acontece no automático. E sabem menos ainda o que as regras significam para suas vidas. E quando sentamos para conversar, é sempre como se estivéssemo em uma “DR”, discutindo a relação.

PASSO DOIS.

Construam uma pequena tabela de regras, e quando fizerem isso, verão que de fato, são poucas. Levantei 10 regras básicas para convívio em casa e 10 na escola, e deixo na descrição abaixo para que seja baixada. Acredito que vai te ajudar. Alguns aspectos da tabela são esses:

1. Em casa: Ao acordar. Regra da casa, levantar na hora; Regra da escola, chegar com o uniforme adequado ( se a escola pede uso de tênis, é tênis);

2. Hora de Estudar. Tanto em casa como na escola, focar nas tarefas, sem distrair e nas horas determinadas;

3. Tempo de Brincar. Em casa e na escola, organizar os brinquedos após o uso.

4. Uso da palavra: usar palavras educadas

5. Tempo de tela.

Nessa lista, a décima regra eu digo que é especial, pois sugere que a criança e o jovem tenham uma tarefa colaborativa tanto em casa quanto na escola. É uma tarefa diferencial, em que eles escolhem qual realizar. Em casa podem escolher naquela semana colocar a mesa do almoço, dar a comida ao pet, jogar o lixo fora etc. Já na escola pode ser o monitor de classe, ajudar um colega, entregar os cadernos, organizar a biblioteca da sala etc. O importante é que TODOS em casa ou na escola tenham sempre uma tarefa específica. E não só as crianças e jovens. Adultos devem apresentar as regras próprias como planejar aulas, sair para trabalhar etc.

PASSO TRÊS.

Regras alinhadas!!

A questão agora é ir para a MESA DE NEGOCIAÇÕES. E a primeira ação é criar um ambiente para isso. Nessa mesa, as regras precisam virar acordos flexíveis. E ACORDO FLEXÍVEL não significa que as regras não serão cumpridas!!

Acordos flexíveis são os limites que você, educador, família ou professores, permitirá dentro de cada acordo. É como se fosse o “elástico” do acordo. E uma pergunta precisa ser feita a si mesmo: até onde você pode esticar o cumprimento do acordo? Pense nisso antes de negociar. Em geral indico que os acordos sejam esticados em no máximo três tentativas. E você entenderá adiante quando falarmos dos combinados.

Outro ponto, na hora de firmar acordos, deixem que eles expressem suas opiniões e necessidades. E é bom lembrar que, acordos precisam ser justos e nada de barganha. Nada de “se você arrumar lavar as mãos antes do café, levará esse lanche para a escola”. E na escola o mesmo. Barganhar habitua a criança desde cedo a relação de “só faço isso se ganhar aquilo”. GANHAR passa a ser moeda de troca.

Um exemplo de negociação de acordos.

Mostre que todos, em casa ou na escola, possuem regras e que já colaboram entre si. E reflitam com eles: Como seria um dia se ninguém fizesse o almoço? Ou se a professora resolvesse não dar aulas? E se a limpeza da sala não fosse feita? E se o porteiro da escola não viesse? E se na rua ninguém coletasse o lixo? E se as pessoas não saíssem para trabalhar? Reflitam com eles sobre o CAOS de uma vida sem regras. E nessa mesa de negociações, entrarão as regras da tabela. Apresente as regras, comece a propor os ACORDOS NEGOCIADOS. Como faremos, quando faremos etc.

PASSO QUATRO.

E esse é o passo que eu considero o mais difícil: o do monitoramento. Ou seja, verificar se os combinados foram cumpridos. É importante deixar claro que, acordos não cumpridos, trarão consequências. Não castigos. Ou seja, vão gerar o que eu vou chamar aqui de OPORTUNIDADES DE CORREÇÃO.

Primeiro, comece a trabalhar internamente consigo, com os próprios pensamentos de impaciência. Não entre no monitoramento com ar de cobrança. Não comece dizendo “Eu já não disse que era para guardar os brinquedos?” A coisa não ficará boa, poderá ficar pior ainda se você disser: “Olha, você nunca faz o que eu mando”. Aí GAME OVER.. Não há mais combinado, a relação dialógica foi para o brejo e as regras por água abaixo.

Então, o que fazer? Segurar a impulsividade, outra daquelas deficiências psicológicas citadas por Pecotche, são 44, lembra? Como resolver essa situação? Vá até a criança e simplesmente diga “Filho ou querido aluno, vi que você ainda não guardou os brinquedos como o combinado. Vamos lá?” Com voz serena, porém firme, olhe nos olhos. Deixe a criança responder. Provavelmente virá alguma resposta de resistência. Escute somente, e nada diga. Mas em seguida fale com a mesma firmeza e educação: "Ok, entendi. Mas vou aguardar você cumprir sua palavra e o nosso acordo, certo em x minutos?" E saia do espaço de visão da criança. Dê um tempo, ou uns minutos a mais.

E aí, não cumpriu? Agora você volta uma segunda vez e faz da mesma forma. Dê um tempo.

Digamos que o acordo não foi cumprido e você perguntaria: “Prof. Sheyla, e agora, o que eu faço?” Volte mais pela terceira vez. Agora é a hora daquela esticada do elástico que citei lá nos acordos. É a hora de esticar !! E não nada de vir com a história de que “um é pouco, dois é bom e três é demais”. Isso é conversa de quem precisa de paciência para educar..

Vá lá, volte e diga com calma: “Terceira vez que venho aqui te lembrar do nosso acordo. E não virei novamente. E se em X minutos o acordo não for cumprido, entraremos no modo: OPORTUNIDADE DE CORREÇÃO” E o que é o que eu chamo de MODO OPORTUNIDADE DE CORREÇÃO? É uma expressão que eu USO para o exato momento de criar as consequências para acordos não cumpridos. Nessa hora, você vai lá e explica: “A oportunidade de correção será: Não guardou os brinquedos, então não irá brincar com eles por um dia”. Fale isso tranquilamente e com firmeza. E não VACILEM em aplicar a OPORTUNIDADE DE CORREÇÃO. As crianças e os jovens precisam entender que para TODO o descumprimento de um acordo, existe uma consequência. E outro ponto importante, essa consequência, PRECISA estar relacionada ao acordo que não FOI cumprido. Logo: o brinquedo não foi guardado? Qual relação tem isso com proibir a ida ao recreio? E o que tem a ver com impedir que brinque com uma coleguinha? Correções precisam estar relacionadas às lacunas dos acordos.

Outro aspecto, as OPORTUNIDADES DE CORREÇÃO precisam ser ajustadas. Como assim? Isso mesmo. Caso o descumprimento do combinado se mantiver, você terá de regular e AMPLIAR a oportunidade de correção. Então, não guardou os brinquedos novamente? Uma semana sem brincar com os brinquedos.. Depois vá tirando outros oportunidades...como não ir à tarde ao parquinho. Nesse sentido, retirar a ida ao parque é válida, pois a criança já entrou em um campo: o de medir forças contigo. Mas não ampliem essas oportunidades todas de uma vez só. Atentem a isso: a mente humana tem capacidade de se ADAPTAR e resistir as correções. E outra coisa, não guardou os brinquedos? Faça com que a criança veja, que outra pessoa está fazendo aquilo no lugar dela. E ao invés de perguntar se ela acha correto isso, criticando. Questione: “O que você acha que pode fazer para lembrar de guardar os brinquedos na próxima vez?”

E outro ponto aos professores: partilhem essas estratégias educadoras com a família nas reuniões. Ganhem o apoio deles.

Existem dois livros que poderão ajudar vocês nessa rota, que são eles: Disciplina positiva para pais e professores. E disciplina Positiva em sala de aula. Eles se encontram na LIVRARIA HUMANISTA desse site.

Finalmente, educar exige muita firmeza, mas especialmente muito amor de nossa parte. Não é fácil...e não disse que seria. Mas encorajem sempre a autonomia, e trabalhem a sensibilidade. Reforcem o positivo, escrevam bilhetes afetivos quando as normas forem cumpridas. Apostem na positividade. Existe um vídeo em nosso canal, e que deixo a seguir o link, que trata exatamente dessa questão, sobre como EDUCAR PELA POSITIVA. E outro sobre a colaboração. Vídeos que interconectam.

Educar é por vezes repetir o caminho de formas diferentes, e a chave é manter a calma, ser consistente, não desistir e oferecer sempre o melhor que vocês puderem dar. Espero ter ajudado, deixo o meu fraterno abraço.

Profa. Dra. Sheyla Fontenele

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