EDUCAR FILOSOFICAMENTE É PRECISO !

Mas o que significa educar filosoficamente? Significa em primeiro término, fazer com que a criança compreenda as bases fundamentais de sua conduta, ou seja, para que possa pensar e sentir bem e no bem.

Por: Joana Darc do Nascimento Barros ; Sheyla Maria Fontenele Macedo

1/18/20238 min read

Grande parte da educação para a vida, que teria de iniciar neste espaço formativo, é aos poucos atribuída, não raramente com totalidade, à escola (de maneira formal), e no segundo momento, as relações sociais, hoje materializada por meio as redes sociais (informalmente) e na sociedade como um todo.

Essa educação se dá por meio de “educações”, através do convívio com múltiplas experiências, que incluem ainda, os colegas, os vizinhos, as experiências do lugar onde vivem. E quando a educação é deixada ao acaso, a terceiros sem uma anuência de preceptores, pais e professores, acontecem “deseducações” que se transformam em uma série de problemas, por vezes, conflitantes.

Educar filosoficamente é uma rota que parte exatamente da premissa do autoconhecimento, do pensar e sentir autônomos, da formação de valores para a vida, dentre outros ensinamentos, que poderíamos aqui elencar. A proposta não é plausível somente à comunidade escolar, mas envolve para além da escola, a família.

Mas o que significa educar filosoficamente?

Significa em primeiro término, fazer com que a criança compreenda as bases fundamentais de sua conduta, ou seja, para que possa pensar e sentir bem e no bem. A educação filosófica não parte, portanto, de uma formação literalmente filosófica, de estudos teóricos sobre a história da Filosofia e seus precursores. Em adesão a Macedo (2018), “[...] é impossível avançar em conhecimentos de cunho reflexivo sem um componente filosófico robusto”. Partindo da premissa mencionada, entendemos que para o acontecer de uma educação reflexiva no universo infantil, precisamos de algo que os faça externar o que já concentram em seu interior, ainda que em estado latente.

Um dos elementos fundamentais deste ensino é a ética, em que os conceitos teriam de ser integrados não somente à prática escolar, como a familiar, tais como os de honestidade, bondade, amizade, paz etc. Via de regra, essas concepções são assimiladas pelo exemplo e logo, se transformam e hábitos, carecendo do viés da reflexão. Em outras palavras, não se aprende conscientemente a ser ético...simplesmente se vai “vivendo” a ética como foi “ensinado”, mas sem o aval da razão. O que pode levar a comportamentos oscilatórios, hora se é ético, hora não. A pesquisa de Barros (2020), nos remete ao ensino da Filosofia para crianças através de um método adequado e porque não eficaz de ensinar as crianças através da maiêutica [...] que permite instigar os aprendizes a parturiar suas ideias, gestadas por vezes, no âmago de si. (p. 12).

Logo, Filosofia para crianças é a perspectiva da educação a partir da reflexão, e porque não dizer da “reflexão sensível” (MACEDO, 2018). Educação refletida “pela” criança, sem as “muletas” dos preceptores. As respostas não são dadas prontas, a não ser que sejam para forçar o avanço formativo. Via de regra, o que se dá é a oportunidade de explorar reflexivamente sua pergunta de modo que o aprendente encontre uma resposta que atenda a sua exigência argumentativa e ao mesmo tento seja coerente com as regras e padrões socioeducacionais. Em outras palavras, a criança irá se auto investigar, ou melhor, indagar sua pergunta ou perguntas, com a ajuda do professor ou educador (família). E tudo começa com um “porquê?”. A partir da pergunta problematizadora, o papel da docência é direcionar a conversa de forma simples e eficaz, sempre recebendo a resposta da criança com respeito para que ela se sinta acolhida e se disponha a continuar sua busca pela resposta ideal, e adicionando à sua resposta uma contra pergunta.

Portanto, é tarefa do professor, observar o rumo das discussões entre as crianças e conduzir sempre para o “centro” quando por ventura se afastarem do objeto em estudo. Caso outras crianças se envolvam na busca, a ocasião se torna uma roda de conversa muito especial, uma verdadeira “Ágora” na sala de aula. Entendemos que um ensino dessa estirpe pode gerar algum desconforto, para a família, no sentido de que os pais carecem de uma formação nesta rota, e da escola, que precisa apresentar resultados somativos, dar o conteúdo. E nem sempre a educação para a formação humana é bem compreendida. A escola pode se mostrar apreensiva em razão das satisfações que precisa prestar aos pais e à sociedade, e desafiar-se ao novo, pode soar como desafio ao projeto lançado pelo sistema regular de ensino. Essa inquietação já era realidade nos nossos estudos: [...] concomitantemente com desejo de fazer uma educação voltada para a reflexão, também está o anseio em instigar a criança a pensar por si de modo crítico e sensível sobre os dilemas do nosso tempo. Nesse sentido, a figura do professor vem sofrendo na realidade brasileira abalos, em que por vezes esse pode ser acusado de desconsiderar ou tornar os valores familiares subjetivos ou sem importância (BARROS, 2020, p. 55).

A rota que apresentamos, está concorde com o ensino clássico, uma educação voltada para a reflexão, a sensibilidade, os valores éticos que foram, são e serão os princípios que regem as famílias e a maioria das instituições sociais, ainda que estejamos sendo testemunhos de um momento atípico, em que esses valores se encontram à margem da sociedade. Portanto, não oferece a insegurança de uma educação voltada para fútil, ou para uma vida sem valores, que modela o “homem light”, como postulou Rojas, 1994.

A apresentação desse conteúdo, também se apresenta como bússola na educação familiar, pois para que haja um elo forte no ensino é primordial que a família eduque filosoficamente a criança antes de mandá-la à escola. Na época clássica, a educação dos preceitos morais e éticos eram de responsabilidade dos pais e a educação dos conteúdos institucionalizados, esses eram de responsabilidade da escola. Se esse princípio fosse mantido, não se tornaria um fardo para escola educar nossas crianças, pois elas já trariam um conteúdo educativo de alto valor.

A educação humanista precisa acontecer com a participação ambas instituições, mas é preciso que cada uma assuma o seu papel. Entendemos que para que esse aprendizado ocorra satisfatoriamente, é fundamental que a família doe seu tempo, especialmente para observar as indagações dos seus filhos, e conscientemente fazê-lo encontrar dentro de si os elementos para torná-lo um ser integral e em busca sempre de sua melhor versão humana. Na verdade, muitas vezes, na pressa de nos livrarmos das indagações dos pequenos, respondemos sem analisar o que perguntam e muitas dessas vezes dizemos não ter tempo. Em nosso formato de educação, essa opção não existe, é preciso ter o tempo de família e ensinar à criança a busca incessante de suas curiosidades. Tempo para educar é preciso e urgente. É preciso sentar, estar de frente a seu filho, ensinar-lhe que ele tem o seu respeito e sua atenção. Olhar nos olhos da criança e perguntar: filho porque você acredita que isso é assim? Ouvir com carinho a resposta dele, fazer o seu julgamento de preceptor, adulto e cidadão e propor-lhe outra pergunta que o faça buscar outra rota que aprimore sua primeira resposta, e se agora houver uma bifurcação? Excelente! Pensar juntos, apresentar novas rotas, opções, dar pistas...deixar pensar, e ainda o advertir que as respostas sobre a vida, o viver, nem sempre se apresentam de imediato, sempre haverá tempo para se responder depois, para mudar de ideia, para conversar novamente e continuar a investigação do assunto em questão.

Em Filosofia o pensar é uma atividade que requer tempo. Esse tipo de educação, estreita os laços familiares, entre professores/alunos e ainda família/escola. É uma relação de ganha-ganha, onde a “mercadoria” de maior valor é o bem comum, e a formação integral da pessoa humana. É o humanismo em ação. Entretanto, admitimos que existe um vilão que se interpõe a esse modelo de ensino e ameaça o avanço para sua efetivação, a saber: a crença de que não se tem tempo. É muito comum ver pessoas correndo no cotidiano e constantemente falarem que estão sem tempo. O trabalho lhes consome por completo o tempo todo. Mas fatos e dados, essa não é toda a verdade. A atual cultura criou “n” atalhos para que a vida se consuma em empreendimentos, que são menores que a própria vida. Dessa forma, a vida acaba se escoando em atividades que não trazem valor a essa mesma vida. A pergunta que podemos fazer é: quais são suas prioridades de vida dentro do seu tempo? Fazemos tal pergunta porque todos têm o mesmo tempo em um dia, as horas são as mesmas para todos, se alguns conseguem e outros não, é porque as prioridades são diferentes.

O que queremos lembrar aqui é que uma vez “pais”, sempre pais. E esse papel sempre acompanhará aquele que teve filhos pelo resto de suas vidas. Logo, isso implica em responsabilidades de mostrar o caminho, a rota para que sejam seres felizes e cidadãos conscientes em um mundo em crise, hoje apoiado em um consumismo exacerbado que muitas vezes acaba sendo a moeda de troca de muitas famílias. Razão pela qual, se justifica “não posso dar tempo de qualidade para meu filho”, mas posso ganhar o bastante para comprar o brinquedo que ele quiser ou até mesmo o celular de última geração, e continuar a formar um “homem massa” como acertadamente asseverou Pecotche (2015).

Acreditamos, que a criança deve tomar contato com a leitura que instigue os valores éticos, bem cedo, pois essa é uma das melhores formas de educar, uma história bem contada, onde apareçam personagens virtuosos, que tenha um objetivo bom para cumprir, que traga uma lição útil para a vida dela, e que os propósitos dessa aventura contada ou lida, sejam verdadeiros caminhos para a vida da criança.

Acreditamos, outrossim, que esses ensinamentos através da contação de histórias, sejam feitos pelos pais, prioritariamente, pois estes, podem trazer histórias familiares, de pais e avós que deixaram um legado e que eles os netinhos possam crescer honrando a família a qual pertence. Porque no fim de tudo percebemos como evidenciava Corso e Corso (2006, p. 40) “afinal, uma vida se faz de histórias – a que vivemos, as que contamos e as que nos contam”. Que possamos contar uma nova história humana e educar para uma geração futura melhor.

REFERÊNCIAS:

BARROS, Joana Darc do Nascimento. Filosofia para Crianças: significados, possibilidades e perspectivas atuais. Dissertação de Mestrado em Ensino. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, 2020. Disponível em: https://propeg.uern.br/ppge/default.asp?item=ppge-dissertacoes-2020 Acesso em: 01 dez. 2022.

CORSO, Diana Lichtenstein, Mário Corso. Fadas no Divã: Psicanálise nas histórias infantis. Portalegre RS. Artmed, 2006.

MACEDO, Sheyla Maria Fontenele. A formação ética profissional do pedagogo na realidade brasileira. Tese (Doutorado em Educação, especialidade Formação de Professores). Universidade de Lisboa, 2018. Disponível em: https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/40071/1/ulsd73150320_td_Sheyla_Macedo.pdf Acesso em: 01 dez. 2022.

PECOTCHE, Carlos Bernardo Gonzáles. Bases para sua conduta. 22.ed. São Paulo: Logosofia, 2015. ROJAS, Enrique. O homem light. Uma vida sem valores. Coimbra: Gráfica de Coimbra, 1994.

ROJAS, Enrique. O homem light. Uma vida sem valores. Coimbra: Gráfica de Coimbra, 1994.

Educar sempre foi considerada uma missão importantíssima, cujo grau de complexidade é significativo, principalmente quando tratamos da educação das crianças, a qual a responsabilidade maior é dos pais e dos professores. Mas quais os fins da educação? Para que uma criança entenda os princípios básicos da vida até chegar à compreensão de como nos movemos socialmente no mundo, ela terá de começar primeiro por entender sobre si mesma, quem é, o que está fazendo por aqui etc. Logo, e nesta educação, precisará reconhecer em primeiro término o valor da vida, de cada coisa, das pessoas e dos animais, do planeta etc. Entretanto, o mundo moderno “obriga” as famílias a serem pragmáticas, e muitas vezes, o ensino de conceitos básicos de vida ficam em segundo plano.