EDUCAR CRIANÇAS CORAJOSAS. Uma conversa urgente para Pais e Professores.

Por: Sheyla Fontenele

5/24/20244 min read

EDUCAR SERES CORAJOSAS; Uma Conversa Urgente para Pais e Professores

Nos últimos dias, diante das imagens das enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul em maio de 2024, questionei a educação que recebemos desde a infância para nos preparar para enfrentar adversidades. Na escola, aprendemos a fazer cálculos, ler, interpretar textos e respeitar a norma culta da Língua Portuguesa. Tudo isso é relevante. Já a família se preocupa em garantir a saúde, segurança, educação formal e bem-estar dos filhos. No entanto, quando o inesperado surge, percebemos uma grande lacuna: pouco ou nada nos foi ensinado sobre como encontrar coragem para enfrentar as dificuldades.

Vivemos acreditando que, de uma hora para outra, um superpoder surgirá magicamente para nos salvar. No entanto, a capacidade de enfrentar com valentia as pequenas ou grandes tribulações é uma aptidão que precisa ser exercitada. Caso contrário, sempre nos sentiremos desamparados e frágeis. Afinal, a vida é feita de bons momentos, mas também de desafios. Saber enfrentá-los com valentia e determinação é fundamental para nossa evolução individual e coletiva.

Surpreendentemente, a educação que recebemos nem sempre nos prepara para grandes tribulações. Para criar um estado interno de coragem, precisamos revisar um conceito fundamental: o que é a felicidade. Talvez você se pergunte: o que a felicidade tem a ver com a capacidade de enfrentar adversidades? Acompanhe minhas reflexões e verá a conexão.

A cultura vigente moldou nossas mentes com vários conceitos, e, no que se refere à felicidade, baseou-se no hedonismo. O hedonismo é a busca incessante da felicidade, a qualquer custo e a qualquer hora. Para o hedonista, os problemas não cabem na felicidade. No entanto, como conceber a vida sem problemas? Uma vida sem problemas gera seres apáticos, enfraquecidos e medrosos, incapazes de enfrentar desafios.

Esse hedonismo cimentou a percepção de que felicidade é possuir. Serei feliz apenas quando tiver aquele celular, aquele sapato, aquela bolsa, aquele amor. Associada a essa ideia está a crença de que a felicidade se situa sempre no futuro. Quando a minha felicidade não chega, ela se esvai, e lá estou eu novamente, fraco e sem forças para enfrentar a realidade. Pior ainda, há quem prefira viver na ilusão, fugindo das causas do fracasso para evitar o encontro consigo mesmo. Encontrar-se é uma das rotas para cultivar valores que nos permitem ser valentes diante da vida.

Quero compartilhar um conceito que tem me ajudado a me tornar uma pessoa mais resiliente. González Pecotche, criador da Pedagogia Humanista de Base Logosófica, ensina que "A felicidade é algo que a vida nos outorga por meio de pequenas porções de bem". É preciso entender essa afirmação e sua relação com a educação para forjar a coragem como valor.

Durante o dia, se estivermos atentos, perceberemos que somos cercados de incontáveis porções de felicidade: no café da manhã, ao ver alguém que amamos, nas lembranças felizes da infância, no orgulho pelas condutas dignas que tivemos, na espera por alguém amado no aeroporto. Esses momentos nos munem de energia para enfrentar infortúnios.

A felicidade pode ser criada. Podemos planejar essas porções de felicidade em nosso dia: dar o nosso melhor em um trabalho difícil, organizar nossos projetos de vida. González Pecotche afirma que, ao colocar a felicidade em um só ponto, diminuímos a felicidade. Por exemplo, esperar ser feliz apenas ao receber a notícia de aprovação em um concurso e, se o resultado for negativo, o dia fica arruinado. Ensinar crianças e jovens a não colocar a felicidade em um único ponto, mas em vários momentos do dia, é fundamental.

Na escola, a resiliência é necessária para aceitar mudanças, como ser mudado de lugar pela professora para integrar a todos. Em casa, um adolescente pode se aborrecer por um almoço não elaborado, mas precisa de compreensão acompanhada de uma mão amorosa e firme. Corrigir não traumatiza; é o pensamento reativo que se sente contrariado.

Outro ponto importante é que a felicidade pode ser planejada, mesmo no caos. Porções de felicidade sustentam a vida de pessoas e animais, como vimos nas enchentes do Rio Grande do Sul. A felicidade em porções fortalece e protege, deixando uma lição: "Não desista, pois tudo passa... a felicidade retomará seu lugar."

A fortaleza e a coragem são essenciais para enfrentar as lutas diárias. Nas palavras de González Pecotche, a fortaleza é a capacidade de enfrentar e superar fatalidades, infortúnios e desafios. É uma força que habita dentro de nós, mas precisa ser ativada pela educação.

Quero recomendar o filme "A Vida é Bela", dirigido por Roberto Benigni, que retrata a história de um pai judeu que protege seu filho das intempéries da guerra com humor e ludicidade. É uma lição de amor e uma aula sobre como colocar a vida como prioridade.

Construir uma fortaleza interna e ser corajoso exige prática diária. Precisamos aproveitar os pequenos momentos do dia para superar medos e praticar a fortaleza. A coragem não vem embrulhada, e às vezes precisamos do outro para encontrar a palavra certa que nos fortalecerá.

Ensinar nossas crianças a olhar a vida com valor e valentia é urgente. Amar a vida é encontrar razões para cuidar dela com força. A vida é uma escola, e o texto de hoje é dedicado aos irmãos do Rio Grande do Sul, que lutam para recriar a felicidade a partir das cinzas. Agradeço a vocês por me ensinarem a ser mais corajosa diante dos problemas. Como ensinou Pecotche, "A luta é a lei da vida." Que possamos aprender com cada experiência.

Até sempre.

Sheyla Fontenele

  • Assista esse trabalho no canal do Youtube.

https://www.youtube.com/watch?v=F9PH7WykM2w&t=1s

REFERÊNCIAS:

PECOTCHE, Carlos Bernardo González. Bases para sua Conduta. 22.ed. São Paulo: Ed. Logosófica, 2015.